sábado, 23 de maio de 2009

Os Romero de Torres

«- Na minha família fomos sempre de metabolismo acelerado. A minha irmã Jesusa, que Deus tenha, era capaz de lanchar uma tortilha de morcela e alho francês e seis ovos a meio da tarde e depois portar-se como um cossaco ao jantar. Chamavam-lhe a Fígados, porque sofria de mau hálito. Era igualzinha a mim, sabe? Com esta mesma tromba e este corpo serrano, bastante magro de carnes. Um médico de Cáceres disse-lhe uma vez que nós, os Romero de Torres, éramos do vínculo perdido entre o homem e o peixe-martelo, porque noventa por cento do nosso organismo é cartilagem, maioritariamente concentrado no nariz e no pavilhão auricular. Na aldeia confundiam muito a Jesusa comigo, porque a desgraçada nunca chegou a desenvolver peito e começou a fazer a barba antes de mim. Morreu tísica aos vinte e dois anos, virgem terminal e apaixonada em segredo por um padre santarrão que quando se cruzava com ela na rua lhe dizia sempre «Viva, Fermín, estás um homenzinho.» Ironias da vida.»

Carlos Ruiz Zafón, in A Sombra do Vento

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